SEM VOCÊ Nº 2

Chico Buarque – Sem Você nº 2 – (Clipe Oficial)

COM VOCÊ

Vou te contar, viu!? Resolvi dar uma espiadinha na tua tristeza, que me chegou aos ouvidos em forma de música… essa daí: Sem Você 2. Pensei na minha em parceria com o poetinha. Sem Você, sem número. Aí me dei conta, arteiro você nunca deixará de ser… Se fosse de fato “sem você”, não teria número, pois 2 já é um par! Bem que o Frei Betto disse que Chico está nos detalhes.

Quanto ao fim do show, já falamos disso. O amor é a coisa mais triste quando se desfaz. A tristeza, nesse caso, é universal. Eu joguei no inglês assim, “love is the saddest thing when it goes away”, você lembra, o Frank cantou numa melancolia tal que chega a dar um nó na garganta da gente.

Pois não é que senti daqui esse mesmo nó ao lhe ouvir entoando “Sem você dei pra falar a sós? O que eu te diria agora? Não tenho respostas, mas queria que estivéssemos juntos como sempre, por aí, é claro, com nosso ilustre par de amigos; um já comigo, Vininha; outro ainda contigo, Toquinho. Aliás, os dois um dia deram pra rebatizar um rebento teu, lembra? “Cotidiano nº 2 (Como dizia o Chico…)”. Lá eles falaram que só se defende da maestria soberana do cotidiano, agarrando-se com o escudo mais apropriado e eficaz: o violão. Se era apenas ele a vencer o fardo do dia-a-dia, nos braços de quem quer que fosse, pois então, imagino o violão nos teus… Eu quero ouvir daqui de cima! Já manda subir o piano pra eu acompanhar, aquele que ficava na garagem lá de casa. Dizem que o som sobe, tal a fumaça que sobra, falta é charuto e cachaça. Aqui não tem nem água de beber, camará!

Mas ela é mesmo assim como diz, seja a moça, a inspiração ou a música. Fica sempre por perto exalando toda a graça, mas nos perdemos em encontrá-las. Comigo não era diferente. Show tem todo dia no céu, ergue a tua cabeça e vem ver enquanto está na plateia, por onde você deve  ficar por muito tempo. Tem arte de montão pra fazer, sorte e paixão pra viver, eu sei.

Sabia que hoje fiz uma nuvem chorona passar por cima de Ipanema? Esse negócio de só chover na roseira, temos que mudar, o divertido é ter praia e chuva, só pra ver as pessoas correndo – eu nunca entendi, se ficam se molhando no mar, porque não se deixam molhar pela água do céu? Falar em sabia, lembrei da Sabiá. Quando se deparar com passarim piador, só assovia comigo, mais nada, feito o vento no ar e a onda no mar. Tem muita natureza na minha música, mas tem ainda mais música minha na natureza.

Agora de longe é que a gente vê que tudo que está acima do chão está no céu. Tão óbvio, não é? Mas eu não sabia. Então, olha só, tuas músicas ficam flutuando aqui, eu adoro, mergulho nelas e me vejo igual a criança em pula-pula piruetando nas melodias. Então, para com isso de “Sem Você”, e número 2 você bem sabe que são os meus Montecristos, nem me lembre deles, saudades sem fim das baforadas. Eu ando sempre ao seu lado, feito anjo da guarda ou assombração, pode escolher. Com você meu número é cena e senha.

Vou terminando. Daqui é que se vê que por aí inventaram tanto tempo e espaço, que nem indo na velocidade da luz se expande feito ela a tal ponto. O mar venceu o futebol e o museu; comigo isso também não seria diferente. Mas quando puder me fala dos centroavantes rasgando o chão, costurando a linha e estufando o filó em nosso Flu. De quebra, diz quem anda errando o toque e o tique-taque, perdendo o pique, o breque e o lance lá pelas bandas do Fla. Você pensa que eu não vi? Pois ouvi “feliz como um pinto no lixo”! E se der, passa no Jardim Botânico, me diz o que falam de mim nesse museu.

E sabe a melhor? Acredite, Chico my love, que quase ouvi você dizer em canto “é um silêncio, Tom”… depois vi que era tal e não Tom! Mas que gostei, gostei.

ACORDO E ME DOU CONTA DESSE SOPRADO EM MEU OUVIDO. CORRO A ABRIR A JANELA E OLHO PARA O CÉU, BUSCANDO EM VÃO ALGUMA NUVEM EM FORMA DE PIANO. NÃO HÁ. MAS JURO QUE VI UM MACUCO – ESSA AVE SOLITÁRIA E TÍMIDA – EM SEU CANTO PIADO, REPETINDO TRÊS VEZES: “MAS NÃO TEM NADA NÃO”…

Brasil, São Paulo, SP, 26/01/1990. Os músicos Tom Jobim (e) e Chico Buarque durante show wm São Paulo. Pasta: 32.529 Foto: Ana Carolina Fernandes
Brasil, São Paulo, 26/1/1990. Foto: Ana Carolina Fernandes

 

Sem Você nº 2

Chico Buarque/2011

Sem você
É o fim do show
Tudo está claro, é tudo tão real
As suas músicas você levou
Mas não faz mal

Sem você
Dei pra falar a sós
Se me pergunto onde ela está, com quem
Respondo trêmulo, levanto a voz
Mas tudo bem

Pois sem você
O tempo é todo meu
Posso até ver o futebol
Ir ao museu, ou não
Passo o domingo olhando o mar
Ondas que vêm
Ondas que vão

Sem você
É um silêncio tal
Que ouço uma nuvem
A vagar no céu
Ou uma lágrima cair no chão
Mas não tem nada, não

sem voce 2 partitura

 

Autor: mantovanni

Mantovanni Colares - um dia inesquecível: o primeiro encontro com Chico Buarque, ao me receber gentilmente no Camarim, antes de um show em Fortaleza, Ceará, Brasil (15/5/1993).

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